terça-feira, 27 de abril de 2010

Páscoa — todos os dias

Lois Rae Carlson

Todos os anos, no domingo de Páscoa, milhares de cristãos comemoram a ressurreição do corpo de Jesus dentre os mortos, a qual ocorreu há mais de 2000 anos. Esse acontecimento, consagrado pelo tempo, merece reconhecimento e celebração. No entanto, também é vital compreender que uma ressurreição do pensamento é uma possibilidade presente para cada um de nós vivenciar, até certo grau, todos os dias de nossa vida.


Mary Baker Eddy explicou que, sob uma perspectiva espiritual, a ressurreição pode ser compreendida como: “A espiritualização do pensamento; uma idéia nova e mais elevada da imortalidade, ou existência espiritual; a capitulação da crença material ante a compreensão espiritual” (Ciência e Saúde, p. 593).


A primeira vez em que vislumbrei o que a ressurreição significa fora do contexto religioso usual, foi certo dia no escritório, enquanto estava em pé, em frente a um armário de arquivos, olhando para um grande relógio que ficava entre minha mesa de trabalho e o escritório do meu chefe, no prédio da Prefeitura onde eu trabalhava. Eu olhava para o relógio para saber se teria tempo de trabalhar em projetos urgentes, antes do início de algumas reuniões. De repente, compreendi que essa era a pergunta errada. Minha intuição espiritual me disse que a questão mais fundamental era: “Como Deus está expressando Suas qualidades divinas neste exato momento”?


Sempre que temos um vislumbre da realidade espiritual, removemos certos blocos de pedra mentais que nos restringem


A resposta que me veio, novamente por intuição espiritual, foi: “Deus é o grande Eu Sou expressando individualidade em Sua criação”. Isso significou para mim que o grande Eu Sou, que ajudou Moisés a realizar sua obra monumental, também estava me ajudando a levar minha carga de trabalho, embora em escala muito menor. Senti a humildade que isso implicava e a graça e a ternura de Deus atuando comigo. Naquele momento de compreensão espiritual, perdi a noção de tempo e espaço. Percebi que minha identidade não era primeiramente a de uma funcionária de escritório, mas a de uma filha de Deus. Sobreveio-me um maravilhoso senso de liberdade, como se tivesse saído de uma tumba de pressão e incerteza. Não me recordo o trabalho que acabei fazendo naquele dia, mas o significado de Deus unido a mim, guiando-me ao longo daquele dia, permaneceu comigo.


Mary Baker Eddy escreveu que “a Vida real é Deus...” (Ciência e Saúde, p. 51). A Vida, portanto, não está tentando cumprir prazos. Não tenta conciliar obrigações e relacionamentos que competem entre si. A Vida é Deus, que é nosso verdadeiro ser, nossa fonte e nossa substância. Sempre que tivermos um vislumbre da realidade espiritual, os blocos de pedra mentais que nos restringem, como blocos de pedra nos encerrando em uma tumba, são, até certo ponto, removidos. Então, seguimos em frente, vivendo mais livremente nossa união com o Espírito divino, a Vida divina.


Certamente pode ser frustrante quando as crenças materiais não cedem rapidamente ou quando parecem tão arraigadas que desafiam qualquer progresso espiritual que já tenhamos feito. O embotamento mental, a fraqueza moral, a falta de inspiração e o fardo de problemas não resolvidos podem parecer muito sombrios e pesados, como se estivéssemos presos em uma tumba. Ao tratar dessa questão, Mary Baker Eddy, em seu livro Miscellaneous Writings [Escritos Diversos], perguntou: “O que é que parece ser uma pedra entre nós e a manhã da ressurreição”?


Após a ressurreição, Jesus parecia liberto de qualquer lembrança de sofrimento


“É a crença de que haja mente na matéria. Somente podemos chegar à ressurreição espiritual por abandonar a antiga consciência de que haja Alma nos sentidos” (p. 179).


A fim de vivenciar a ressurreição, ou seja, abandonar “a velha consciência” necessitamos seguir o exemplo de Jesus, que venceu todos os obstáculos mortais por sempre expressar a natureza do Cristo. Talvez possamos ser bombardeados todos os dias com a evidência material contrária à natureza perfeita, espiritual e eterna, e que Jesus tão inequivocamente demonstrou em suas obras de cura e em sua ressurreição. Contudo, podemos evitar que nosso olhar se fixe em qualquer buraco negro da materialidade e, em vez disso, podemos elevar nosso pensamento para o sentido espiritual de existência, que Jesus nos mostrou ser a única real. Ao nos empenharmos em viver de acordo com esse sentido espiritual a respeito da vida, vamos nos descobrir renovados, ressuscitados, gravitando cada vez mais em direção à evidência espiritual da Vida eterna.


Sempre me chamou atenção o fato de que, após sua ressurreição, quando Jesus falou com dois dos seus discípulos no caminho de Emaús (ver Lucas 24:13–32), ou ainda ao aparecer aos discípulos reunidos em uma sala trancada por medo dos líderes judeus (ver João 20:19–21), e também às margens do mar da Galileia (ver João 21:1–14), ele nunca se queixou por ter passado pela crucificação. Ele não falou sobre quão amedrontador foi ter ficado em uma tumba, nem como foram cruéis os soldados. Também não repreendeu severamente a covardia de Pedro por ter negado que conhecia Jesus (ver Mateus 26:69–75), nem condenou os outros por não estarem junto à cruz. Não ficou magoado nem entristecido devido à traição e ao suicídio de Judas (ver Mateus 27:3–5). Jesus expressou tal autoridade e força após a ressurreição, que parecia totalmente liberto de qualquer lembrança de sofrimento.


Não precisamos nos sentir atormentados nem viver estressados


Ao seguir o exemplo de Jesus, não precisamos ficar ruminando sobre as coisas desagradáveis que aconteceram conosco. Nem precisamos especular sobre outras adversidades que possam acontecer no futuro. Ao contrário, o Cristo, descrito no livro Ciência e Saúde como “a idéia verdadeira que proclama o bem, a mensagem divina de Deus aos homens, a qual fala à consciência humana” (p. 332), nos diz que este é o momento para vivermos na liberdade do amor todo-abrangente de Deus. O momento de honrarmos o bem como a preciosa evidência da presença e do poder de Deus. Este é o momento de abandonarmos a miséria da mortalidade e vivermos no regozijo do relacionamento com nosso Pai-Mãe Deus.


O que essa herança divina significa é que podemos parar de viver com medo. Não precisamos nos sentir atormentados nem viver estressados. Por outro lado, não existe nenhuma nuvem de tédio sobre dias vazios. A cada dia e em todos os dias o Cristo está presente em nosso pensamento para silenciar a especulação sobre as piores possibilidades, isto é, para ressuscitar o pensamento por meio de novas ideias e soluções.


Podemos parar de concordar com as limitações em nossa vida e com a inevitabilidade da velhice, decadência e morte


O poder do Cristo que Jesus demonstrou está aqui, agora mesmo, ajudando-nos a despertar do sonho de vida na matéria. Podemos parar de concordar com as limitações em nossa vida e com a inevitabilidade da velhice, decadência e morte. Quando as obrigações no lar, no trabalho ou na igreja competem entre si, podemos volver nossos pensamentos para a ordem perfeita do universo do Princípio divino, com a expectativa de que nossas agendas estarão de acordo com essa perfeita ordem. Quando sofremos devido a desapontamentos, podemos reconhecer que o Amor divino está presente, envolvendo a todos nós com terna solicitude e conforto. Quando males físicos parecem nos exaurir, podemos ficar atentos para ouvir o Cristo, atentos às divinas mensagens que anulam o sofrimento.


Sempre que nos afastamos do tédio da mortalidade e nos volvemos à gratidão pela nossa vida em Deus, vivenciamos a ressurreição, ou seja, “a capitulação da crença material ante a compreensão espiritual”. O Cristo está aqui e agora agindo como a lei divina em nossa vida, impelindo nossa libertação de todos os aspectos da escravidão mortal. À medida que seguirmos a luz do Cristo, mesmo nas experiências mais mundanas da vida, encontraremos nosso caminho, dia após dia, para fora da tumba da materialidade rumo à Vida eterna. É isso que faz com que todo dia seja um Dia de Páscoa, um dia de grande regozijo!


Lois é Praticista, Conferencista e Professora de Ciência Cristã, e mora em Chicago, Illinois, EUA.

Um comentário:

  1. Gostei da parte que diz que, quem vive verdadeiramente em Deus, esquece todo o sofrimento e isso me lembra o trecho de uma música de Leonardo Gonçalves: "Livre sou, livre sou
    Só me resta abrir os braços e desfrutar da esperança que ele deixou(...). Quero ser livre dos meus preconceitos, livre dos meus erros
    Quero ser livre das lembranças que me prendem ao passado(...)". Abraço!

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